sábado, 7 de janeiro de 2017

A Era da Tísica.

           Imagem aérea parcial de São José dos Campos; ao centro o Sanatório Vicentina Aranha.
                                              FONTE: Arquivo Público Municipal.

            Desde tempos remotos a humanidade tem convivido com as mais variedades formas e tipos de doenças, principalmente as contagiosas. Em muitos casos, as moléstias eram consideradas, já nos tempos antigos, como castigo ou punição divina. Nos tempos bíblicos, a doença mais temida era a lepra, conhecida atualmente pelo nome de hanseníase. Os Evangelhos mencionam diversas passagens contendo leprosos como participantes ou protagonistas dos sofrimentos e segregação à que estavam sujeitos. Na Judéia, ocupada pelos romanos, os habitantes seguiam a Lei de Moisés, a qual determinava que em caso de doenças contagiosas, os enfermos teriam de ser expulsos das cidades e aldeias fortificadas. A lepra é citada, por exemplo, no Antigo Testamento, quando é descrito o episódio de Naamã, general arameu, que teria sido curado ao se banhar sete vezes no Rio Jordão, seguindo a orientação do profeta Eliseu. A mencionada doença, porém, não fazia distinção de classe ou status social, sendo por isso considerada a doença mais temida da época. Por outro lado, na Europa medieval entre 1347 e 1349, a Peste Negra ceifou aproximadamente um terço da população. O flagelo foi tão virulento que chegou a interromper durante certo tempo as hostilidades entre a França e a Inglaterra na Guerra dos Cem Anos (1346–1453). Da mesma forma que a lepra, igualmente ativa na Idade Média, a peste tem suas causas na falta de higiene e ambas eram relacionadas como consequência dos pecados da humanidade. Assim, a epidemia era considerada uma punição de Deus contra os pecadores.
            Com a conquista e dominação ibérica no continente americano, os europeus trouxeram, além da cruz e da espada, diversas doenças contagiosas desconhecidas pelos indígenas como a gripe, o sarampo e a varíola, por exemplo. Sem a imunidade no organismo para tais enfermidades, as mesmas causaram enorme mortalidade entre os ameríndios nos séculos XVI e XVII. De acordo com a análise do historiador Cláudio Bertolli Filho, o processo “de conquista e ocupação do Novo Mundo construiu-se enquanto momento traumático, onde a presença europeia e africana resultou na imposição de novas e mortais enfermidades à população autóctone da América”. Para o autor, as doenças importadas causaram mortes em massa entre os índios, mais do que as armas e maus tratos, tendo sido então, “o principal fator que viabilizou o triunfo da colonização e também da desorganização das estruturas tribais”. Entre o final do século XVIII e o inicio do XIX, as doenças infectocontagiosas ainda castigavam de forma avassaladora os silvícolas, sendo que a enfermidade mais comum seria a sífilis, disseminada por brancos, negros e mamelucos, somada ao uso excessivo de bebidas alcoólicas. Em viagem pela Capitania de São Paulo, passando pelo Vale do Paraíba no ano de 1817, os naturalistas alemães Johann Baptist von Spix e Carl Friederich Phillip von Martius, relataram os Guaianases como marcados pelo fealdade e degeneração moral, causadas pelas doenças. Outros viajantes, como Auguste Cesar Provençal de Saint-Hilaire, também relataram cenas de epidemias, onde homens e mulheres aparecem com sinais da cirrose hepática e do bócio.
            Ao longo do período colonial, a população valeparaibana (incluindo senhores, escravos e indígenas) sofreu com patologias como a sarna, bicheira, lombrigas, escorbuto, bouba, hidropisia, sarampo, além da própria lepra, já mencionada. Para Cláudio Bertolli, além da sífilis, haviam outras doenças transmitidas sexualmente, como o cancro e a blenorragia. Outra doença que castigava os habitantes era a corrupção, também identificada como sendo a diarreia, a qual não havendo controle pode levar à morte, devido à desidratação. Nos tempos coloniais, a então colônia lusitana, carente de recursos, sofria constantemente com a diarreia, sendo que a mesma, ao piorar o estado de saúde da vitima, somente era estancada à base do saca-trapo, de uso comum até a Guerra do Paraguai. Tal método consistia em introduzir no reto do convalescente um bastão com algodão contendo pólvora, pimenta e tabaco. Caso contrário, o paciente viria à óbito, devido à gravidade da moléstia. No século XIX, o Vale do Paraíba seria atingido por uma nova onda de epidemias, como a lepra, novamente o chamado “mal de São Lázaro e a varíola, também conhecida como o mal das bexigas”. No caso da primeira, Bertolli Filho afirma que a população valeparaibana, principalmente agregados e escravos mantinham o hábito de dormir no chão, direto e sem proteção para a pele. O autor salienta também que as condições materiais e os parcos recursos dos desvalidos propiciavam “o surgimento de outras enfermidades que eram confundidas com a lepra, dentre elas o pênfigo foliáceo (fogo selvagem), o piao ou o puru-puru (dermatose comum entre os indígenas), a filariose de origem africana (elefantíase), casos avançados de escabiose (sarna)” e ainda, as já citadas doenças venéreas. Sendo assim, em um censo organizado pelo Governo da Província de São Paulo em 1820, o Vale do Paraíba foi apontado como tendo 65,8% dos morféticos, totalizando 371 casos de doença. Desses, 92 doentes eram de Taubaté. A partir do referido censo, as autoridades provinciais passaram a construir lazaretos para abrigar os enfermos que eram expulsos dos centos urbanos, assim como já ocorria nos tempos antigos. A varíola, por sua vez, grassou no território valeparaibano desde meados do século XVIII, tendo nas Vilas de Taubaté e Guaratinguetá, seus centros irradiadores, junto com Santos e São Paulo. Da mesma forma que a lepra, os variolosos ou bexiguentos eram excluídos do contato das áreas urbanas, devido ao temor do contágio, apesar de o Conselho Ultramarino nunca ter ordenado tal medida. Novamente, segundo Cláudio Bertolli, as autoridades decidiram realizar uma campanha antivariólica no Vale do Paraíba, o qual “foi uma das áreas mais insistentemente vistoriada (...), tornando-se cenário de seguidas intervenções reguladoras dos comportamentos coletivos que visam a regeneração moral da população, com o intuito de impor a toda gente os então denominados deveres civilizados”. Consequentemente, na Vila de Taubaté, por exemplo, alguns habitantes foram punidos com alguns dias na cadeia, por se entregarem à danças escandalosas, o mesmo ocorrendo com alguns vadios e libertinos de Areias, São Luiz do Paraitinga e Ubatuba.
            Entretanto, apesar de relacionar as causas das doenças infecciosas com pecados, vícios, e degeneração moral da população, sobretudo dos excluídos, a questão higiênica passa a ser abordada em fins do século XIX. No Rio de Janeiro, capital do Império e depois da República, o esgoto “corria” a céu aberto, contendo vários tipos de sujeira como excrementos e carcaças de animais mortos que não eram removidas. Além disso, as pessoas tinham o hábito de lançarem pelas janelas das casas os conteúdos dos urinóis – tanto liquido como sólido – atirando-os nas vias públicas, prática que seria proibida pelas autoridades. Segundo a análise de Ana Maria Santos Sousa e Luiz Laerte Soares, os excrementos humanos também “eram esgotados nos urinóis, que abasteciam os tigres, e depois, lançados nos quintais, nos rios ou no mar”. Sendo assim no início do século XX, a capital federal passaria, por um intenso processo de remodelação e urbanização, empreendido pelo Prefeito Pereira Passos. Segundo Ana Maria Sousa e Luiz Laerte Soares, o saneamento e embelezamento da urbe carioca contaram com o autoritarismo do Estado, onde as “interferências autoritárias e segregadoras (...) aguardam estreitas similaridades com as intervenções urbanísticas aplicadas nas metrópoles européias (...). A população pobre significava perigo e constituía o foco ideal para espalhar as doenças a serem combatidas”. Em 1905, como símbolo do progresso e da modernidade é inaugurada a Avenida Central no Rio de Janeiro.
            Porém, o Vale do Paraíba ainda iria conhecer outra epidemia mortífera entre o final do século XIX e o inicio do século XX, durante até mais ou menos a década de 1950. A “nova” enfermidade atacava suas vítimas através dos pulmões e, na ampla maioria das vezes levava o doente à morte. Segundo a análise do médico Douglas Carlyle Belculfiné, nas ultimas décadas do oitocentos, no Velho Mundo, os cientistas buscavam avançar nos estudos de doenças infectocontagiosas, “principalmente  da tuberculose que ceifava a vida de milhões de pessoas por ano. Era incessante a busca pelo agente causador  de doenças, assim como o medicamento que pudessem por fim ao sofrimento dos enfermos”. De acordo com o médico tisiologista, no ano de 1859, com os trabalhos de Brehmer, chegou-se ao conceito de tratamento climático em locais de altitudes elevadas, onde o bacilo não iria resistir às baixas porcentagens de oxigênio, tese contestada pelo seu paciente e assistente Deitweiller, segundo o qual apenas o repouso ao ar livre era suficiente. No ano de 1882, o médico e bacteriologista alemão Robert Koch anunciou a descoberta do bacilo Mycobacterium tuberculosis, causador da doença denominada tuberculose, também chamada de tísica. A partir de então, o causador da enfermidade ficou conhecido como “Bacilo de Koch”. A moléstia se caracterizava por lesões nos pulmões, oriundos pela formação de granulomas chamadas tubérculos; os principais sintomas são: o emagrecimento, perda de apetite, tosse, expectoração contendo sangue, suores noturnos e febre no período da tarde.
            Por volta de 1881, o médico tisiólogo Clemente Ferreira elogiava, no Rio de Janeiro, as condições de São José dos Campos e Campos de Jordão, então parte integrante de São Bento do Sapucaí, como benéficas para o tratamento da doença. Dessa forma, ambas as localidades passaram a ser procuradas por levas de doentes do peito de várias partes do Brasil, em especial do Rio de Janeiro e São Paulo. Com a construção da ferrovia que ligaria Pindamonhangaba a Campos do Jordão, o transporte pareceria assegurado aos enfermos ansiosos pela cura. Mas os que se utilizavam do assim chamado “ trem dos tuberculosos”, ainda que doentes, eram os que dispunham de amplos recursos financeiros, ao posso que os desprovidos de tais recursos eram abandonados à própria sorte. Nas palavras de Douglas Carlyle Belculfiné o que acontecia geralmente, “é que muitos desses doentes, ao apartarem na estação ferroviária de Pindamonhangaba, eram encaminhados para São José dos Campos, não permitindo mesmo que eles chegassem a subir a serra para Campos de Jordão”. Outras possibilidades podem ter ocorrido para a preferência por São José dos Campos, como o fato de se localizar às margens da principal ferrovia do pais, no meio do caminho entre Rio de Janeiro e São Paulo, bem como da inauguração, na década de 1920, da Rodovia Washington Luís, também ligando as duas principais cidades (Estrada Velha Rio-São Paulo). Havia também o fato da chegada do médico tisiologista Mário Nunes Galvão a São José dos Campos, ele próprio enfermo, que buscando a cura restabeleceu a saúde, fixou residência na cidade e tornou-se referência no tratamento da moléstia. Outros médicos chegaram a cidade como Fritz Jacobs e José de Asprer Garcia, sucedendo ao italiano Giovanni Guglielmino (João Guilhermino), este o primeiro a fixar residência em São José dos Campos no ano de 1876, junto com Mario Galvão viriam também na década de 1910, Gaspar Barbosa de Rezende e Nelson Silveira D’Ávila, também enfermos que obtiveram a cura e marcaram a historia de São José.
             Os infectados impedidos de irem a Campos de Jordão, como afirmado, rumavam para São José dos Campos; ao desembarcarem dos trens eram alojados em hotéis, pensões e até em casas particulares, cujos proprietários cediam pelo menos um cômodo para os contaminados. Alguns faleciam no mesmo dia da chegada. Mesmo com a procura, faltavam condições mínimas como infraestrutura e profissionais de saúde. Como entre os doentes estavam, médicos, aos quais fizemos referência, os mesmos apesar de serem, segundo Douglas Carlyle, em números reduzidos, “exerceram um papel muito importante nesse período da história”. Dispondo de poucos recursos, exerceram um trabalho desgastante e, pela convivência constante com seus pacientes, estabeleceu-se uma integração forte, tornando-os idolatrados pela causa que abraçaram. Trataram e conseguiram salvar a vida, nem sempre é claro, de muitos tuberculosos e, constantemente atendiam doentes sem condições financeiras para o tratamento e, nem por isso os abandonavam. Através desse grupo de tisiólogos, começou a crescer em São José dos Campos, a ideia da necessidade de se construírem sanatórios para aprimorar o atendimento aos portadores do bacilo de Koch. A primeira tentativa em 1911, porém, não logrou êxito; José Bento Monteiro Lobato firmou contato com a Prefeitura e Câmara Municipal de São José dos Campos e o Governo do Estado para a construção de um sanatório. O projeto não vingou porque as autoridades estaduais consideraram-no oneroso demais.
             No entanto, no ano de 1914, por iniciativa de Vicentina de Queirós Aranha, esposa do Senador Olavo Egídio, teve inicio a campanha para a construção de um sanatório em São José dos Campos. Lançada na cidade de São Paulo, a campanha de Vicentina teve a ajuda da Câmara Municipal paulistana, que vota e aprova uma verba de 100:000$000 (cem contos de réis), dobrada por outra do Governo Federal, auxiliada ainda pelos comerciantes paulistanos em 390:000$000, numa etapa e 123:000$000 em outra. Para não ficar de fora, a Câmara de São José entra com a soma de 3:000$000. A incentivadora falece prematuramente, mas a sua iniciativa continua; em uma chácara de 435.724m², adquirida de Maria Carolina Schuvenck de Magalhães, que chegava até o Ribeirão da Vidoca, é inaugurada no dia 27 de abril de 1924, o Sanatório Vicentina Aranha. O sanatório, de propriedade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, teve o seu projeto elaborado pelo arquiteto Francisco de Paula Ramos de Azevedo e pelo engenheiro civil Arnaldo Vieira de Carvalho. Segundo a análise da Arquiteta Tânia Bittencourt, o Sanatório Vicentina Aranha foi reconhecido como sendo o mais completo, contendo o melhor arranjo espacial; “apontado como um dos maiores da América Latina, configura-se como a obra mais importante do período denominado fase sanatorial, e que, além do padrão de serviço oferecido, serviu com referência obrigatória para outras edificações, no município com finalidades idênticas”.
            Todavia, se por um lado, o Sanatório Vicentina Aranha despertava temor de uma invasão de tuberculosos, como informou o Correio Joseense em sua edição nº 208, de 27 de abril de1924, apesar de contemporizar que o sanatório contaria com “doentes de classe, aqueles que pagam a sua estadia sem regatear preço, de modo que os pobres ingressarão em quantidade infinitamente menor”, citado por Augusto Dias; por outro mostrava o seu lado elitista, segundo a opinião de Altino Bondesan. O ilustre advogado e escritor, também ex-tísico, tendo vindo para São José dos Campos em 1935 e obtido a cura, afirma em obra conceituada que doente “rico ou remediado ia para sanatório. Doente modesto ia para as pensões sanatoriais. Os mais pobres formavam repúblicas. As casas eram baratas, não havia dificuldades em conseguir uma, em plena avenida 24 de outubro (atual Avenida Dr. Nelson D’ Ávila), onde o prefeito Dória mandava plantar cedrinhos, em canteiros centrais”. Apesar das presença de sanatórios, algumas pensões ainda eram dignas de menção como a carioca, de propriedade de Frediano Bianchi; São João, de José Matarazzo; Dom Bosco, de Renato Fonseca; a de José Taddei, a de Emanuel Rosemberg, a  Romon Ovalle, a de Elvira Chiocchi; a São José cujo proprietário  era João Muzacco; a São Geraldo, etc. 
          Nesse ínterim, apesar da afirmação de Altino Bondesan, de que o tuberculoso era bem aceito na sociedade joseense, o fato é que havia casos de discriminação e preconceito. Por exemplo, os forasteiros passaram a ser vistos como portadores de bacilo de Koch, sendo evitados quando se aproximavam de pessoas sãs. Quando algum doente (ou suspeito de ser doente) visitava alguém, o anfitrião tratava de separar talheres, copos e pratos, devido ao temor do contágio da moléstia. Mesmo assim, a presença dos infectados em São José dos Campos alavancava a economia da cidade. Como consequência, o Prefeito Rui Rodrigues Dória afirmou que São José dos Campos não precisava de indústrias e  máquinas, pois isso era para Jacareí e Taubaté. A cidade precisava então de doentes, pois isso era a indústria de que São José necessitava. Ainda assim, a tuberculose era relacionada ao pecado e a vida desregrada. Da mesma maneira que as outras doenças mencionadas no presente artigo, citando o Boletim Médico de 1934, Nara Rúbia Martins, Carlos Eduardo de Quadro, Suele França Costa e Valéria Zanetti afirmam que ao mesmo tempo em que o referido Boletim “retratava a tísica como um mal social, cujo cerne da propagação era a miséria da população, também se afirmava que a doença era fruto, sobretudo da imoralidade do  próprio individuo infectado”. No ano de 1935, a cidade de São José dos Campos é transformada em Estância Climática, através do decreto nº. 7.007, assinado por Armando Salles de Oliveira, Interventor Federal no Estado de São Paulo. Isso possibilitava a São José receber maiores investimentos por parte do governo estadual. Segundo Vitor Chuster, “a possibilidade de reforçar a receita do município era uma luz ao final do túnel, claro que isso nos custou a autonomia, Prefeito seria indicação do Governo do Estado. Também em 1935 é inaugurado o Pavilhão de Hygiene, destinado à desinfecção e esterilização de objetivos de uso de tuberculosos como também à lavagens de roupas”, segundo Chuster.
          Na realidade, o que se implantou em São José dos Campos foi a “Indústria da Tuberculose”, pois de acordo com o depoimento de Altino Bondesan, em um determinado momento os enfermos passam a marcar a tônica na vida cotidiana na cidade. Na opinião do advogado e escritor, com a debilidade dos infectados “vinha a potência financeira da cidade. De sua presença se beneficiava a prefeitura de um orçamento duplo, o que arrecadava normalmente e o que lhe vinha do Estado”, após advento da Estância Climatérica e Hidromineral. Para atrair os enfermos e justificar a fama da cidade, propagou-se a ideia de que o local possuía “bons ares” para a cura da moléstia algo divulgado desde os fins do século XIX. Sendo assim, após a inauguração do “Vicentina Aranha”, outros sanatórios surgiriam, como a “Vila Samaritana” inaugurada em 1929, localizado na Rua Paraibuna, atualmente preservado e funcionando com Colégio Técnico de  uma instituição de ensino; o Sanatório Maria Imaculada, inaugurado  em 1935, localizado na Rua Major Antônio Domingues, funcionando como hospital geriátrico; o Sanatório Ruy Dória, inaugurado em  1934, a partir da pensão São Geraldo localizada na Rua Vilaça, atualmente demolido; o Sanatório São José, inaugurado em 1946 e localizado na Rua Paraibuna, demolido em 1983; o Sanatório Antoninho da Rocha Marmo, localizado na Avenida Heitor Villa-Lobos, inaugurado em 1952, funcionando atualmente como creche. A comunidade judaica, por sua vez construiu em sanatório exclusivo para seus membros; inaugurado em 1936 o Sanatório Ezra localizava-se, onde atualmente está o Parque Municipal Santos Dumont. Houve outros projetos de construção de sanatórios que não se concretizaram, como o Sanatório Penitenciária, o Sanatório do Sindicato dos Trabalhadores do Teatro, etc.
         No entanto, para facilitar o empreendimento das construções de sanatórios a Prefeitura, divide a cidade de São José dos Campos, no ano de 1938 em quatro zonas administrativas: a Zona Comercial, a Residencial, a Sanatorial (já delimitada em 1932) e a Industrial. A contradição existente é que se procurava isolar os  tuberculosos e ao mesmo tempo necessitavam de sua presença, pois isso trazia alta receita para o município. No auge da fase sanatorial, tanto São José dos Campos, como Campos do Jordão lucravam com a tísica, recebendo ambas, a alcunha de “tisiópolis”. A possibilidade de cura era um mero detalhe, uma vez que a alta taxa de mortalidade entre os enfermos significava alta taxa de lucro para as funerárias, outro setor a lucrar com o bacilo de Koch.
         Contudo, após a inauguração da Rodovia Presidente Dutra, a instalação de grandes indústrias, redirecionou os rumos econômicos de São José dos Campos. Com o desenvolvimento de novas técnicas de tratamento, de medicamentos eficazes, além da cirurgia torácica, a fase dos micuins entra em declínio. A maioria dos sanatórios e pensões foram fechados e demolidos, outros se transformam em hospitais geriátricos, dentre eles o Vicentina Aranha e o Maria Imaculada, como afirmado anteriormente. São José dos Campos entra com tudo na nova fase, a da industrialização e da tecnologia, tentando, porém, apagar a memória do passado dos micuins . Um fato sintomático é o caso do Sanatório Vicentina Aranha, que mobilizou a opinião pública da cidade, evitando uma eventual demolição. Após a fase sanatorial, passou a atender idosos convalescentes até o inicio do atual século; desativado, o poder público municipal adquiriu todo o complexo da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, por volta de 2006, com a intenção de demoli-lo, segundo reportagem veiculada por um importante jornal regional. Devido às pressões exercidas, as autoridades recuaram e o primeiro sanatório da cidade está em projeto  de restauração e seu entorno no centro urbano foi transformado em parque. Isso pode possibilitar que a memória da fase sanatorial deva ser preservada, como qualquer parte da história, para que possamos conhecer o sofrimento e o descaso que nossos antepassados sentiram.  Principalmente, os doentes do peito que, acalentados pela falsa imagem dos “bons ares” e “climas benéficos”, mesmo sem recursos, almejavam a cura para a preservação da vida. Alguns obtiveram o restabelecimento da saúde, mas muitos foram os que sucumbiram à tísica. Até a próxima.

                                                                                                      Eddy Carlos.


Dicas para consultas.

BERTOLLI FILHO, Cláudio. Vale do Paraíba: Saúde e Sociedade (1750-1822). UNIVAP. São José dos Campos, 1995.  

BITTENCOURT, Tânia. Arquitetura Sanatorial. Unidos Artes Gráficas. São José dos Campos, 1967.

BONDESAN, ALTINO. São José em Quatro Tempos. Bentivegna. São José dos Campos, 1967.

DIAS, Augusto. Um tempo na vida em São José dos Campos. JAC Editora. São José dos Campos, 2000.

PAPALI e ZANETTI, Maria Aparecida e Valéria (Orgs.). São José dos Campos. História e Cidade. 5 Volumes. São José dos Campos, 2008, 2009 e 2010.

SOUSA E SOARES, Ana Maria Santa e Luiz Laerte. Modernidade e Urbanismo Sanitário; São José dos Campos. Papercron. São José dos Campos, 2002.

 E-mail: eddycarlos@ymail.com

Um comentário:

  1. Texto, muito bacana e esclarecer de forma simples consegue dar um panorama bem realístico sobre o crescimento da cidade e de uma forma dificilmente abordada. Parabéns ao autor.

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