sexta-feira, 9 de setembro de 2016

O Vale na Visão de Zaluar.

                                  Imagem de Augusto Emílio Zaluar, extraída da internet.

                 
                       O Vale do Paraíba, assim como todo o Brasil, despertou a atenção de viajantes, cientistas, botânicos e naturalistas europeus, principalmente após a vinda da corte portuguesa para os trópicos. Conforme mencionado no último artigo vieram exploradores de diversas regiões da Europa, como a Áustria, Prússia, Inglaterra, etc. No Vale destacou-se em 1822, o francês Saint-Hilaire, sendo que um pouco antes em 1817, tenha passado na região o pintor inglês Thomas Ender. Entre os anos de 1860 e 1861, outro viajante percorreu, também em lombo de burro, as terras valeparaibanas, deixando-nos um interessante relato dos lugares onde havia passado. Estamos nos referindo ao jornalista português naturalizado brasileiro Augusto Emílio Zaluar, nascido em Lisboa em 1825 e falecido no Rio de Janeiro em 1882. No ano de 1849 vem para o Brasil, residindo na cidade de Paraíba do Sul; depois em Vassouras e na capital do Império. Devido a sua atuação literária, Zaluar cai nas graças de D.Pedro II e, após ser condecorado pelo monarca como “Cavaleiro da Ordem da Rosa”, é eleito sócio efetivo do Instituto Histórico Brasileiro a 10 de novembro de 1876.
              No entanto, apesar de interessante a obra de Zaluar “Peregrinação pela Província de São Paulo”, o seu trajeto de viagem é bem mais curto do que fez o seu antecessor, Saint-Hilaire, quase quarenta anos antes. O périplo do francês tinha objetivos científicos, ao passo que o de Zaluar era apenas narrativo e descritivo, o que porém, não o descredencia como autor de importante obra sobre a Província de São Paulo, sobretudo do Vale do Paraíba. O itinerário do jornalista luso-brasileiro incluiu além do Rio de Janeiro de onde partiu, Barra Mansa, Resende, Bananal, São José do Barreiro, Areias, Queluz, Silveiras, Lorena, Guaratinguetá, Pindamonhangaba, Caçapava, Taubaté, São José dos Campos, Jacareí, Mogi das Cruzes, São Paulo, Campinas, Piracicaba, Sorocaba, Porto Feliz, Itú, Santos e São Vicente.
            Todavia, para nossa informação, vamos focalizar o trecho correspondente ao Vale do Paraíba. Uma das características de Augusto Emílio Zaluar era a de se hospedar sempre junto de pessoas ricas e influentes por onde passava, desde fazendeiros, políticos e autoridades militares, diferente do francês que não fazia distinção. A outra característica era o olhar crítico elogiando ou menosprezando esta ou aquela cidade. Dessa forma, Bananal, apesar da riqueza do café, não escapa às críticas, pois os edifícios públicos são “pobres, feios, mal construídos”; somente a Casa da Misericórdia e, claro, os prédios particulares são enaltecidos pelo jornalista. Para o contraste existente em Bananal, Zaluar afirma que o local “foi até certo tempo um campo constantemente aberto à exploração dos ambiciosos políticos”.
             Na Vila do Barreiro, o viajante destaca a beleza da Fazenda Catadupa, próxima a nascente do rio Formoso e a nítida divisão da Vila em bairro nobre e pobre, sendo esta parte composta por casebres cobertos de sapé. Em Areias, é destacada a quantidade de lojas considerável para uma população estimada em 7.000 pessoas. Saindo da Estrada Geral (atual Estrada dos Tropeiros), Zaluar dirige-se a Queluz, observando que ali produzia-se por ano 200.000 arrobas de café e elogiando a construção da matriz, obra de José Antônio Dias Novaes. É relatada também, a origem da Vila em prol dos Puris, mais tarde dizimados pelo contato com a colonização. Em Silveiras, chama a atenção do viajante o teatro particular do Capitão Félix de Castro e o cemitério “murado em roda e fechado por um grande portão”, único na região, segundo o jornalista. Mas não perdoa a arquitetura da casa da Câmara, considerada de mau gosto. Prosseguindo o seu roteiro, Zaluar deixa Silveiras com sentido a Lorena. Como trafegava pela Estrada Geral desde o Rio de Janeiro, a sua viagem não inclui Cachoeira Paulista, nem o Embaú, pelo fato de a referida estrada situar-se à margem direita do Paraíba.
               Ao registrar sua passagem por Lorena, o viajante menciona o francês Saint-Hilaire, que já havia se encantado da cidade com suas construções residenciais que “merecem mencionar-se pela sua grandeza e elegância”. Dentre os prédios admirados estão o de Joaquim José Moreira Lima, João Batista de Azevedo e o do Padre Manuel Teotônio de Castro. O comércio de Lorena, também é destacado, possuindo mais de 70 lojas, embora a safra do café não atingisse 100.000 arrobas naquele ano de 1860. Outro fato que Zaluar registrou é sobre o caráter dos habitantes de Lorena, o qual “é franco, inteligente e caprichoso na realização dos melhoramentos locais”. Quanto ao elemento feminino, o peregrino afirma que as lorenenses “são notáveis pela sua formosura e pelo bom gosto com que se vestem, além de sua educação apurada e natural talento”. Depois de Guaratinguetá, onde a população é estimada em 34.000 pessoas, Zaluar pára na pequena capela dedicada a Nossa Senhora Aparecida, fazendo referência a religiosidade da população e aos inúmeros objetos de promessas dos fiéis que alcançaram os milagres pedidos. A própria capela já não comportava grande número de devotos. Ao longo de sua viagem e narrativa, Zaluar como já citado, faz elogios e críticas. Em Caçapava e Taubaté a população é considerada tristonha e sem iniciativa; em São José do Paraíba (São José dos Campos), apesar de admirar belas paisagens, afirma que os habitantes são indolentes e preguiçosos, enquanto que em Jacareí o povo é atrasado. Em todo o seu trajeto, o Rio Paraíba é que merece maior atenção pela sua formosura e, depois de São Paulo é a vez de o Tietê ser mencionado.
             Contudo, se por um lado o viajante jornalista é severo demais com a população pobre e generoso com os mais afortunados, devemos reconhecer em sua obra as pesadas críticas que faz tanto às administrações, municipal, de cada cidade, provincial e imperial. Por todos os lugares que passou Zaluar aponta o descaso com vias de acesso (pontes, estradas, etc.), com a saúde e o precário estado das Santas Casas da época e com a instrução pública. Em Lorena, por exemplo, o viajante luso-brasileiro é categórico: “Os professores são aqui, como em quase toda a província mesquinhamente recompensados”. Como se vê, tais problemas não são de hoje. Até breve. 
                                                                                                   Eddy Carlos.


Indicações para consulta.
ZALUAR, Augusto Emílio. Peregrinação pela Província de São Paulo. (1860-1861). Coleção Biblioteca Histórica Paulista. Vol. 2. Livraria Martins Editora. São Paulo, 1976.

LENCIONI, Célio. Jacareí. Viajantes e Cronistas. Editora Santuário. Aparecida, 1991.

FREITAS, Oswaldo Carvalho. Aparecida. Capital Mariana do Brasil. Editora Santuário Aparecida, 1978.

MAIA e MAIA, Tom e Thereza Regina de Camargo. Vale do Paraíba. Vida Cultural. Centro Educacional Objetivo. Cadernos Culturais do Vale do Paraíba. Caçapava, 1988.


Blog: redescobrindoovale.blogspot.com.br 

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